José Antonio Klaes Roig
Deus ex machina é um recurso tecnológico, conhecido
desde a antiguidade. Segundo a Wikipédia: “Sua origem encontra-se no teatro grego e refere-se a uma inesperada,
artificial ou improvável personagem, artefato ou evento introduzido
repentinamente em um trabalho de ficção ou drama para resolver uma situação ou
desemaranhar uma trama. Este dispositivo é na verdade uma invenção grega. No
teatro grego havia muitas peças que terminavam com um deus sendo literalmente
baixado por um guindaste até o local da encenação. Esse deus então amarrava
todas as pontas soltas da história”.
O
bom educador é de certa forma um ator, que precisa convencer o aluno para o que
está ensinando, mostrar e demonstrar, por exemplo, o poder e a magia dos
números e das letras, amarrando ao final todas as pontas de seu discurso, com
adequada didática e metodologia.
A
matemática pode se tornar “matemática”, a literatura pode ser uma pequena
máquina do tempo, promovendo um verdadeiro teletransporte sem sair do local.
Entrementes, o bom professor é um ator social e não um ilusionista, ou um
prestidigitador que faz mágicas sem mostrar ao alunado o segredo daquele
truque. O verdadeiro educador é justamente aquele que, como o Mister M da TV, desvenda os mecanismos
da ilusão e do desconhecimento, fazendo que a informação gera o conhecimento
mútuo. Educar não é iludir, mas dialogar e demonstrar os caminhos entre a
teoria e a prática.
Hoje,
mais do que nunca, muitos confundem o uso das tecnologias da comunicação e da
informação (TIC), bem como as redes e mídias sociais, como o novíssimo Deus ex machina, que elevará a qualidade
do ensino, apenas incorporando maquinário sem pensar em formas metodológicas e
didáticas de inclusão desta parafernália no ambiente escolar. Mais do que
elevar o aluno, através de cabos e roldanas e/ou guindastes, dando a impressão
que este tornou-se um deus no palco escolar e da vida, cabe ao educador do
século XXI pensar, antes de tudo no usuário e no conteúdo. Estes sim, que devem
ser elevados, na devida proporção. O maquinário deve ser o acessório e não o
bem principal do conteúdo educacional, sob pena de estarmos apenas encenando e
não educando. Simulando uma elevação física e não pedagógica e social.
Quando
falam em programas inclusivos, como um computador por aluno, que são louváveis,
penso que a aprendizagem se faz muitas vezes, não por conta das condições
ideais, mas pelas próprias limitações que o meio promove. Ao invés de um
computador por aluno, já vivenciei projetos e atividades em sentido oposto: um
computador por turma, três ou mais alunos por computador e os resultados foram igualmente
satisfatórios. O foco precisa ser o aluno e não a máquina, que muitas vezes é
comparada a um deus, grego, romano, baiano, tanto faz. Até pelo fato de que o
notebook já foi moderníssimo e sonho de consumo de todos, sendo recentemente
substituído pelo tablet, que logo
perderá seu espaço para outra inovação. Mas sempre é bom lembrar que as
máquinas executam comandos e que, até prova em contrário, ainda que a
inteligência artificial deixe de ser tema de ficção científica e se incorpore ao
nosso cotidiano, a inventividade humana sempre será o diferencial desta
equação, pois nenhuma máquina – nem mesmo o Deep Blue, supercomputador com
seus milhões de cálculos por segundo,
que após alguns confrontos derrotou o campeão mundial de xadrez Gary Kasparov
-, substituirá a vivência de um bom professor, que aprendeu com os erros, que
aprendeu e nos ensinou a sua lição de vida, acima de tudo, elevando-nos, não
por cabos e roldanas, mas por experimentação, erro, repetição, acerto e
elevação...
O
deus não está na máquina, mas poderá ou deveria estar sempre no usuário que
manipula a máquina à sua imagem e semelhança. Todo educador precisa ter esta
consciência de que a máquina, se bem utilizada no ambiente escolar, poderá
elevar o rendimento do aluno. Para que isso ocorra, faz-se necessário que
simultaneamente ao processo de inclusão de maquinário aja também a interação do
professor com seu alunado, de forma colaborativa, e com seu colega de trabalho
de forma cooperativa, trocando informações, ideias, planejando projetos
coletivos, multi e interdisciplinares,
fazendo de fato e de direito o diálogo entre as diversas áreas do conhecimento.
Feito
isso, apropriando-se das mídias e redes sociais, produzindo e refletindo sobre
sua prática, via blog e site educacional, divulgando os projetos e atividades
no Twitter, Facebook, Linkedin entre outros, o “deus” que está na máquina e na
rede, poderá de fato elevar a todos, a partir de um conteúdo relevante,
tornando o local em universal: A grande aldeia global ser influenciada por
projetos das pequenas aldeias digitais e vice-versa.
Pensar
a tecnologia na educação é destacar o conteúdo e o usuário, mais do que o
usuário, do contrário, estaremos fazendo teatro e simulação da realidade e não
educação de boa qualidade, sejamos gregos ou troianos. E poderemos até mesmo
estar criando um Cavalo de Troia contra nós mesmos, se não dermos sentido e
significado às máquinas, aos deuses e à educação. Afinal, inovar é fazer coisas
simples, mas sustentáveis, ao invés de coisas grandiosas, estressantes e sem
continuidade. Citando @ieducadigital: “Para as crianças: internet é uma rede
entre pessoas. Para os pais delas, é uma rede entre computadores.” Parece-me
que os jovens não endeusam tanto às máquinas como pais e professores, o que é
um bom sinal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário